O presente artigo, ora reproduzido com pequenas inserções em razão da atualidade do tema, foi escrito em agosto de 2008 e publicado, na ocasião, no jornal CORREIO de Uberlândia(MG). É da lavra de José Clástode Martelli, de sua exclusiva responsabilidade e não traduz, necessariamente, a opinião do Instituto ou de seus membros.
210 dias sem CPMF
Há alguns anos tivemos a oportunidade de participar de reuniões com um grupo, capitaneado pelo então Dep. Federal Marcos Cintra, professor da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo, que estudava a criação do Imposto Único, no Brasil, ideia essa que se tornaria bandeira do Professor Marcos, enquanto homem público. Sabíamos todos que a proposta era quase inexeqüível, senão utópica. Porém a esperança de que os impostos se tornariam mais simples, menos sonegados e distribuídos de maneira equânime entre municípios, estados e União nos fazia acalentar grandes sonhos. Imaginávamos que a carga tributária poderia ser menos onerosa porque incluiria muitos contribuintes que não recolhiam impostos, seja lançando mão de artifícios legais, seja simplesmente porque não os recolhiam.
Por isso, quando o Dr. Adib Jatene, então Ministro da Saúde, propôs a criação da CPMF, contribuição provisória sobre movimentação financeira, para atender aos reclamos de sua pasta, enchemo-nos de esperanças porque ali estava o embrião do imposto único, atingindo a todos, direta ou indiretamente, na razão exata da participação de cada um, sem a menor possibilidade de sonegação (grifo atual) , garantindo uma arrecadação segura e com destino certo. Tínhamos a expectativa de que o sistema da CPMF deixaria de ser provisória e passaria a ser definitiva, beneficiando, não apenas a saúde, mas também outros setores da sociedade como educação, segurança e habitação, dentre outros, fazendo valer as garantias constitucionais, principalmente aos mais carentes.
Por outro lado sempre entendemos que o grande problema não é a carga tributária. O grande problema é a injustiça na divisão de sua cobrança e a distorção na sua aplicação. Foi o que se viu com a CPMF. Em princípio uma cobrança justa, sem possibilidade de sonegação, repetimos, atingindo diretamente os mais aquinhoados, mas aplicada, infelizmente, com alguns pequenos desvios, mas o bastante para que os grandes movimentadores de fortunas e seus porta-vozes, a grande mídia, se insurgissem contra ela, da mesma forma como está ocorrendo atualmente.
Finalmente, por decisão do Senado Federal, em 31 de dezembro de 2007, a CPMF foi extinta com o que parecia aos olhos de todos, irrespondíveis argumentos, então largamente difundidos pela mídia, tal como está ocorrendo hoje, para impedir sua recriação.
Alardeava-se que o custo de vida, de maneira geral, iria baixar com a eliminação do dito imposto em cascata que vinha embutido nos produtos, em razão da cobrança da CPMF. Não baixou.
O custo da cesta básica, especialmente, iria cair em razão da não incidência, várias vezes, dessa contribuição em seus produtos. Não caiu.
Os pobres, mesmo os que não tinham contas bancárias, passariam a ter mais dinheiro em seus bolsos. Não passaram.
Toda rede de saúde privada passaria a oferece serviços mais baratos e um atendimento melhor. Não ofereceu.
As universidades, as escolas de nível médio e outros níveis, igualmente desobrigadas do recolhimento obrigatório da CPMF, baixariam os preços de suas mensalidades e passariam a oferecer melhores salários aos seus funcionários e professores. Não baixaram e não oferecerem grandes melhorias.
Além dos argumentos retro que, com vimos, se revelaram inexatos, outra explicação para a extinção era a de que os recursos arrecadados eram aplicados incorretamente. Sob este argumento os nossos legisladores acharam mais fácil eliminar a Contribuição do que corrigir suas distorções.
Ou teriam sido outros os motivos? Se foram, fica este artigo como mote para reflexão dos leitores, até porque aqueles mesmos motivos que levaram à sua extinção, em 2007, e que se revelaram equivocados, voltam agora com maior virulência.
Por fim, nunca é demais reproduzir uma singela simulação feita pelo atual Ministro da Saúde Quem recebe R$ 1.000,00 líquidos, de salário, passaria a receber R$ 998,00. E quem recebe ou movimenta R$ 10.000,00 passaria a receber R$ 9.980,00 Pergunte a quem ganha menos se ele não concordaria em pagar R$ 2,00 para investir na saúde que ele recebe sem contribuição adicional.
O resto meus senhores, imposto em cascata onerando os pobres e outros argumentos pífios, já foram suficientemente desmentidos quando a CPMF foi extinta na data mencionada. É claro que as grandes movimentações financeiras, algumas até ilegais ou provenientes de negócios escusos, não escapavam e não escaparão da tributação. Portanto, salvo melhor juízo, aqui é onde está o nicho dos que são contrários à sua recriação, ressalvados, evidentemente, os que tenham motivos políticos para enfraquecer o atual governo, mesmo que isso prejudique todos brasileiros.