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Responsabilidade Social
BIODIESEL E INCLUSÃO SOCIAL-Partes I/II-Depoimento da Ex-Dep.Federal Mariângela Duarte
110 mil em 2010, com previsão de atingir 200 mil até o final de 2014 são os números de Agricultores Familiares - AF, segundo o Ministério de Desenvolvimento Agrário-MDA, engajados no Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel - PNPB.
Mas, para se chegar a esses resultados, houve muita luta, perseverança, competência e convencimento por parte de um razoável número de abnegados brasileiros.
É sobre essa luta e essa abnegação, que não se pode perder no tempo, o teor do presente depoimento.
Nele pretendo deixar consignados não apenas os fatos dos quais participei direta e intensamente, como também outros dos quais tomei conhecimento em decorrência dessa minha participação.
Embora pretenda fazer um relato conciso, ele se refere a quatro anos ininterruptos de sugestões, projetos, exposições, persuasão e relatórios, motivo pelo qual vou dividi-lo nas seguintes fases para sua melhor compreensão:
- a primeira, que vai do nascedouro da ideia até a instituição do Grupo de Trabalho Interministerial - GTI, encarregado de apresentar estudos sobre a viabilidade da utilização de óleo vegetal-biodiesel como fonte alternativa de energia;
-a segunda, do início dos trabalhos do GTI, até o seu Relatório Final;
-a terceira, do relatório final do GTI, até a conclusão do marco regulatório que antecedeu à promulgação da Lei 11.097, de 13 de janeiro de 2005, que introduziu o biodiesel na matriz energética brasileira; e,
- a quarta, da Lei 11.097, de 2005, passando pela criação e regulamentação do selo “Combustível Social” e terminando com o estabelecimento, pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), dos leilões públicos para aquisição de biodiesel destinado à mistura obrigatória com o diesel mineral, reservando 80% do suprimento dessa demanda exclusivamente para empresas vinculadas à agricultura familiar, ou seja, detentoras do selo “Combustível Social”.
PRIMEIRA PARTE
Em 2002, o Engenheiro Agrônomo Mário Sérgio Trento desenvolvia estudos sobre “Gestão de Programas de Assentamentos da Reforma Agrária-RA” no curso de pós-graduação Lato Sensu da Universidade Federal de Lavras-MG. Buscava introduzir, nesse trabalho, a sustentabilidade tão almejada, não apenas para os assentamentos oriundos da RA, como também para os cerca de 5 milhões de pequenos agricultores do Brasil, quase todos com características de AF. Entendia que essa sustentabilidade poderia perfeitamente vir do plantio de matérias primas para a produção de biodiesel, um biocombustível do qual já se tinha conhecimento desde 1980, no Brasil, através das experiências do Prof. Expedito José de Sá Parente, da Universidade Federal do Ceará e, mais recentemente, pela Portaria 313, de 27.12.2001, da Agência Nacional de Petróleo - ANP, que regulamentava a importação de biodiesel; pelo Projeto de Lei 6.983, de 12.06.02, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que instituía o Programa Biodiesel, com obrigatoriedade de adição desse biocombustível no diesel fóssil; e pela Portaria 702, de 25.10.02, do Ministério de Ciência e Tecnologia-MCT, que instituiu o Programa Brasileiro de Desenvolvimento Tecnológico de Biodiesel - Probiodiesel.
Por outro lado, o Eng. Mário Trento era Secretário Adjunto de Agricultura e Abastecimento de Uberlândia-MG, cidade que abrigava a sede do Instituto Volta ao Campo de Desenvolvimento Rural - IVC, entidade sem fins lucrativos com a missão principal de, através de uma assistência técnica integral, multidisciplinar, presencial e permanente, cuja metodologia detém, levar essa sustentabilidade ao pequeno produtor rural brasileiro, dentre os quais estavam inseridos os AF. O IVC fora contratado pela Prefeitura Municipal de Uberlândia para dar suporte ao seu Programa de Assistência Técnica Rural. Assim, expôs suas ideias ao IVC e este, através do seu fundador e então Diretor Presidente, Prof. José Clástode Martelli, abraçou-as e passou a trabalhar, com o apoio total e irrestrito do Prefeito Municipal, na época, Dr. Zaire Rezende e de seu Secretário de Agricultura e Abastecimento, Prof. Vicente Rocha sucedido pelo Prof. Olavo Vieira da Silva.
Nesse afã, o Grupo do IVC e técnicos da Prefeitura de Uberlândia procuraram-me informando-me de que, de janeiro a março de 2003, estiveram expondo o Projeto Biodiesel & Assistência Multidisciplinar do Sistema Volta ao Campo, lançado em 20.01.03, no Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento-MAPA, MDA e INCRA (no Distrito Federal e em Belo Horizonte) e queriam que eu o conhecesse e, se fosse o caso, o levasse a Deputados Federais interessados no assunto e, especialmente, ao segmento menos favorecido da agricultura nacional constituído pelos agricultores familiares. Conhecedora das dificuldades desse segmento agrícola e de várias e, infelizmente, infrutíferas tentativas de superá-las, interessei-me pelo Projeto.
Inteirada de seu conteúdo e de sua proposta, passei a me entusiasmar pelo mesmo e, conforme me pediram, fizemos um périplo pela Câmara Federal conversando com vários deputados, dentre os quais destaco Ariosto Holanda, Luiz Piauhylino, Gilmar Machado, Luiza Erundina, Telma de Souza, Adão Prieto e César Medeiros. Nessas conversas, acompanhei os representantes do IVC a vários Gabinetes e, a cada apresentação, ficava mais entusiasmada porque era a primeira vez que tomava conhecimento de uma proposta robusta e capaz de promover a inclusão dos segmentos mais carentes de nossa agricultura, mas não em programas assistencialistas, e sim em projetos de geração de renda e de conquista da cidadania.
Fiquei de tal forma envolvida que, em 19.03.03, requeri uma Audiência Pública, na Comissão de Ciência, Tecnologia e Informática, encaminhando ofício ao seu Presidente, Deputado Corauci Sobrinho, para que nela fosse debatido o Projeto Biodiesel & Sistema Volta ao Campo. Solicitava fossem convidados, dentre outros, Dr. Roberto Amaral (MCT), Dr. Roberto Rodrigues (MAPA), Dr. Miguel Rosseto (MDA), Prof. Vicente Rocha (SMAAB), Dr. José Clástode Martelli (IVC), Dr. Mário Sérgio Trento (IVC) e o Coordenador do antes mencionado Probiodiesel. Como justificativa, eu explicitava que a AUDIÊNCIA visava levar ao conhecimento público e aos membros daquela Comissão a importância do Projeto com foco na Agricultura Familiar, gerando emprego e renda no campo.
É preciso que se diga que, anteriormente, em 11.03.03, o IVC encaminhara a mim e ao Deputado César Medeiros, um ofício sugerindo que fosse desarquivado o Projeto do Deputado Mendes Thame, já referido, que fora arquivado em 31.01.03 ou, alternativamente, fosse apresentado outro similar, introduzindo-se a participação prioritária da AF na cadeia produtiva do biodiesel, com a produção de matéria prima viabilizada por uma assistência técnica integral, multidisciplinar, presencial e permanente, a esses pequenos agricultores, o que geraria muito mais emprego e renda do que a propiciada pela agricultura extensiva e mecanizada.
De pronto, em 12.03.03, encaminhamos, eu e o Deputado César Medeiros, ofício circunstanciado ao Ministro Roberto Amaral do MCT, anexando o Projeto Biodiesel & Sistema Volta ao Campo e solicitando, ao final, uma audiência para tratarmos do assunto e, ainda, o encaminhamento e integração à discussão desse Projeto dos demais órgãos do Governo, cuja participação reputamos de fundamental importância, especialmente o MDA, pelo foco predominante nele contido, de INCLUSÂO SOCIAL da AF, além do Ministério de Trabalho e Emprego, de Minas e Energia, do Meio Ambiente, da Casa Civil, da Educação, da Petrobras, da Agência Nacional de Petróleo e da Coordenação do Probiodiesel.
Entrementes, no mesmo dia em que requeri a AUDIÊNCIA PÙBLICA (19.03.03), o Deputado Rubens Otoni Gomide entrava com um Projeto de Lei que regulamentava o uso do biodiesel no Brasil, nos mesmos moldes da propositura do Deputado Mendes Thame, então arquivada e, tal como aquela, sem a inserção da AF no processo.
Paralelamente, atendendo nosso requerimento, foi marcada a Audiência Pública para o dia 07.05.03, no Plenário 13, Anexo II, às 11 horas, para debater o tema proposto por mim, qual seja o Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar.
Foram convidados para o debate o Secretário de Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia-MME, Marcelo Popp; a Secretária de Petróleo e Gás do MME, Maria das Graças Foster; o Secretário de Política Tecnológica e Empresarial do MCT, Francelino Grando; o Secretário de Agricultura Familiar do MDA, Valter Bianchini; o Administrador do INCRA, Ailson Silveira Machado; o sócio-gerente da Soyminas Biodiesel, Arthur Augusto Alves; o Diretor do Departamento do Açúcar e do Álcool do MAPA, Ângelo Bressan e o representante do Instituto Volta ao Campo de Desenvolvimento Rural - IVC.
Anteriormente fora realizado, em Ribeirão Preto, no dia 14.03.03, organizado pelo Laboratório de Desenvolvimento de Tecnologias Limpas - LADETEL, da Universidade de São Paulo, o Primeiro Congresso Internacional de Biodiesel que foi, ao lado das ações anteriormente mencionadas, um dos marcos mais importantes para a implementação do Programa do Biodiesel no Brasil. Foi depois desse Congresso que a Coordenação do Programa passou do MCT para o MME, antes de passar definitivamente para a Casa Civil. Infelizmente não se cogitava, ainda, da participação da agricultura familiar no processo.
Finalmente, no dia 07.05.03 foi realizada a AUDIÊNCIA PÚBLICA por mim solicitada e, após seu encerramento, tive oportunidade de ratificar minha opinião de que o Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar, proposto pelo IVC e que fora objeto de debate no evento, poderia viabilizar economicamente pequenos núcleos familiares, dando-lhes oportunidade de trabalho, aumentando significativamente sua renda e incluindo-os, definitivamente, na sociedade brasileira. Falei inclusive com o Presidente da Câmara, Deputado João Paulo, que prometeu que da primeira pauta do Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica, que seria reinstalado no dia 28.05.05, constaria o tema Biodiesel e Inclusão Social. A par disso informei, na ocasião, que me reuniria com o Ministro Miguel Rossetto para discutir estratégias de inclusão da produção do biodiesel para os assentados da RA em particular e, para a AF, de maneira geral.
Por sua importância histórica e por ser o marco inicial da inclusão social propiciada pelo Biodiesel, transcrevemos, em separado, os pronunciamentos dos técnicos que falaram em nome do IVC na audiência pública (O Economista José Honório Accarini e o Engenheiro Agrônomo Mário Sérgio Trento).
Posteriormente, em audiência que tive com o Ministro Chefe da Casa Civil, Sr. José Dirceu, em 18.06.03, entreguei ao mesmo o Ofício 142, de 2003, com os seguintes dizeres: “Sr. Ministro, submetemos ao conhecimento e à apreciação de V.Exa. o Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar, de alta relevância para solucionar questões importantes relativas à redução da dependência externa do petróleo e eliminação da pobreza no campo” Nessa mesma audiência, o Ministro confirmou minha participação no Grupo de Trabalho Interministerial que, por sugestão nossa, na Audiência Pública realizada em 07.05.03, antes referida, fora instituído pelo Presidente da República por meio de Decreto de 02.07.03, com o propósito de apresentar estudos sobre a viabilidade de utilização de óleo vegetal-biodiesel, como fonte alternativa de energia, e propor, caso necessário, as ações que garantam o seu uso.
Concomitantemente, em 18.06.03, o IVC encaminhava, a esta Deputada Federal, sugestão para um substitutivo ao Projeto de Lei do Deputado Rubens Otoni Gomide no qual se inseria o cultivo de matéria prima por pequenos produtores rurais e, para que fique consignado o foco da luta do IVC, transcrevemos o Parágrafo Terceiro do Art. 2° desse substitutivo sugerido.
“As fábricas adquirirão preferencialmente matéria-prima de produtores organizados em cooperativas de produção que, para se habilitarem a essa venda, deverão manter contratos/convênios com associações de técnicos que assistam seus associados integral, multidisciplinar, permanente e proativamente, de forma a garantir o fornecimento dos produtos com qualidade e regularidade necessárias.”
SEGUNDA PARTE
Por todo o empenho que tivemos para incluir a AF no Programa Biodiesel, que já tomara o nome de Biodiesel e Inclusão Social desde a reinstalação da Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica, presidido pelo Deputado Luiz Piauhylino, e que tinha como relator o grande defensor dessa inclusão, o Deputado Ariosto Holanda, passamos, eu e o IVC, a ter a esperança, ou seria melhor dizer, a certeza de que o GTI, instituído em 02.07.03, sob a Coordenação da Casa Civil da Presidência da República e composto por representantes do Ministério dos Transportes (MT); da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA); do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC); de Minas e Energia (MME); da Fazenda (MF); do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP); da Ciência e Tecnologia (MCT); do Meio Ambiente (MMA); do Desenvolvimento Agrário (MDA); da Integração Nacional (MI) e das Cidades (MCidades), concluiria pela inclusão da AF no Programa.
Convidados pela Casa Civil, a Prefeitura Municipal de Uberlândia - PMU e o IVC, participaram dos trabalhos do GTI, em reunião realizada no dia 25.09.03, na qual estiveram presentes, pelo GTI, representantes do MF, MT, MAPA, MDIC, MME, MP, MCT, MMA, MDA, MI e do MCidades; pela PMU o Eng. Agr. Telmo Vinicius da Silva e o Agrimensor José Soares de Aquino e, pelo IVC, o Eng.Agr. Mário Sérgio Trento e o Adv. Agrarista José Clástode Martelli. Participou também da reunião o Sr. Arthur Augusto Alves, sócio-gerente de uma pequena usina de biodiesel em Cássia-MG, que desenvolvia trabalhos em conjunto com o IVC no sentido de viabilizar uma indústria idêntica, em Uberlândia, com a participação da agricultura familiar.
Os trabalhos foram iniciados com a apresentação pelo Grupo de Uberlândia, do Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar, com cópias entregues a cada um dos participantes, tendo como ideia básica a viabilização de assentamentos e AF mediante uma assistência técnica integral, multidisciplinar, permanente e presencial, com a organização de produtores, preferencialmente em cooperativas, para abastecer pequenas unidades fabris de biodiesel, garantindo a esses pequenos produtores uma renda que lhes proporcionasse sustento, progresso, dignidade e cidadania.
Como resultado imediato dos debates e das várias intervenções, ficou acertada uma viagem de representante ministeriais no GTI Biodiesel a Cássia-MG, onde estava a fábrica Soyminas Biodiesel, em pleno funcionamento (visita que se realizou posteriormente) e da conclusão a que se chegou da INDISPENSABILIDADE da Assistência Técnica, com a consequente organização dos produtores para um Programa que visa a alavancagem de oportunidades de trabalho, emprego e renda no segmento da pequena agricultura nacional.
Por oportuno e como alerta, já que atualmente 80% do biodiesel produzido no País provêm da soja, transcrevemos, também em separado, artigo publicado em 09.10.03, no Jornal CORREIO de Uberlândia, sobre a instalação do GTI, de autoria do Advogado Agrarista, Prof. José Clástode Martelli, então Presidente do Conselho Diretor do IVC.
Em 22.10.03, o Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica fez um convite ao IVC para que participasse de uma videoconferência a realizar-se em 05.11.03 sobre o tema Biodiesel e Inclusão Social e também sobre uma exposição a respeito do mesmo tema que teria lugar na Câmara dos Deputados, no período de 03 a 07.11.03. O IVC participou de ambos os eventos. No primeiro caso, sob o título Combustíveis Renováveis: Emprego e Renda no Campo, o pronunciamento do IVC, feito pelo Eng. Agr. Mário Sérgio Trento e pelo Prof. José Clástode Martelli está publicado no Caderno de Altos Estudos nº 1, do Conselho e segue a mesma linha de defesa da participação da AF no processo.
No mesmo dia da videoconferência, o Jornal O Estado de S. Paulo publicava um artigo desses mesmos representantes do IVCsob o título: O Biodiesel e os Municípios, em que abordam, dentre outras vantagens propiciadas pelo biodiesel, o aumento do PIB municipal, com instalação de usinas nos municípios. Também aqui, pela sua importância, e por interessar muito a Prefeitos, vamos transcrever esse artigo em separado.
Em 17.11.03, o IVC, ao agradecer ao Deputado Ariosto Holanda a oportunidade de participar dos trabalhos do Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica, escrevia:
"A par de termos enriquecido sobremaneira nosso conhecimento, a ponderada e eficiente condução dos trabalhos por parte de Vossa Excelência nos fez esperançosos de que a Assistência Técnica Integral, Multidisciplinar, Pró-ativa e Permanente a pequenos produtores rurais passe a ser entendida como pedra angular no processo de inclusão social através do biodiesel.”
Responsabilidade Social
BIODIESEL E INCLUSÃO SOCIAL-Partes I/II-Depoimento da Ex-Dep.Federal Mariângela Duarte
110 mil em 2010, com previsão de atingir 200 mil até o final de 2014 são os números de Agricultores Familiares - AF, segundo o Ministério de Desenvolvimento Agrário-MDA, engajados no Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel - PNPB.
Mas, para se chegar a esses resultados, houve muita luta, perseverança, competência e convencimento por parte de um razoável número de abnegados brasileiros.
É sobre essa luta e essa abnegação, que não se pode perder no tempo, o teor do presente depoimento.
Nele pretendo deixar consignados não apenas os fatos dos quais participei direta e intensamente, como também outros dos quais tomei conhecimento em decorrência dessa minha participação.
Embora pretenda fazer um relato conciso, ele se refere a quatro anos ininterruptos de sugestões, projetos, exposições, persuasão e relatórios, motivo pelo qual vou dividi-lo nas seguintes fases para sua melhor compreensão:
- a primeira, que vai do nascedouro da ideia até a instituição do Grupo de Trabalho Interministerial - GTI, encarregado de apresentar estudos sobre a viabilidade da utilização de óleo vegetal-biodiesel como fonte alternativa de energia;
-a segunda, do início dos trabalhos do GTI, até o seu Relatório Final;
-a terceira, do relatório final do GTI, até a conclusão do marco regulatório que antecedeu à promulgação da Lei 11.097, de 13 de janeiro de 2005, que introduziu o biodiesel na matriz energética brasileira; e,
- a quarta, da Lei 11.097, de 2005, passando pela criação e regulamentação do selo “Combustível Social” e terminando com o estabelecimento, pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), dos leilões públicos para aquisição de biodiesel destinado à mistura obrigatória com o diesel mineral, reservando 80% do suprimento dessa demanda exclusivamente para empresas vinculadas à agricultura familiar, ou seja, detentoras do selo “Combustível Social”.
PRIMEIRA PARTE
Em 2002, o Engenheiro Agrônomo Mário Sérgio Trento desenvolvia estudos sobre “Gestão de Programas de Assentamentos da Reforma Agrária-RA” no curso de pós-graduação Lato Sensu da Universidade Federal de Lavras-MG. Buscava introduzir, nesse trabalho, a sustentabilidade tão almejada, não apenas para os assentamentos oriundos da RA, como também para os cerca de 5 milhões de pequenos agricultores do Brasil, quase todos com características de AF. Entendia que essa sustentabilidade poderia perfeitamente vir do plantio de matérias primas para a produção de biodiesel, um biocombustível do qual já se tinha conhecimento desde 1980, no Brasil, através das experiências do Prof. Expedito José de Sá Parente, da Universidade Federal do Ceará e, mais recentemente, pela Portaria 313, de 27.12.2001, da Agência Nacional de Petróleo - ANP, que regulamentava a importação de biodiesel; pelo Projeto de Lei 6.983, de 12.06.02, do Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, que instituía o Programa Biodiesel, com obrigatoriedade de adição desse biocombustível no diesel fóssil; e pela Portaria 702, de 25.10.02, do Ministério de Ciência e Tecnologia-MCT, que instituiu o Programa Brasileiro de Desenvolvimento Tecnológico de Biodiesel - Probiodiesel.
Por outro lado, o Eng. Mário Trento era Secretário Adjunto de Agricultura e Abastecimento de Uberlândia-MG, cidade que abrigava a sede do Instituto Volta ao Campo de Desenvolvimento Rural - IVC, entidade sem fins lucrativos com a missão principal de, através de uma assistência técnica integral, multidisciplinar, presencial e permanente, cuja metodologia detém, levar essa sustentabilidade ao pequeno produtor rural brasileiro, dentre os quais estavam inseridos os AF. O IVC fora contratado pela Prefeitura Municipal de Uberlândia para dar suporte ao seu Programa de Assistência Técnica Rural. Assim, expôs suas ideias ao IVC e este, através do seu fundador e então Diretor Presidente, Prof. José Clástode Martelli, abraçou-as e passou a trabalhar, com o apoio total e irrestrito do Prefeito Municipal, na época, Dr. Zaire Rezende e de seu Secretário de Agricultura e Abastecimento, Prof. Vicente Rocha sucedido pelo Prof. Olavo Vieira da Silva.
Nesse afã, o Grupo do IVC e técnicos da Prefeitura de Uberlândia procuraram-me informando-me de que, de janeiro a março de 2003, estiveram expondo o Projeto Biodiesel & Assistência Multidisciplinar do Sistema Volta ao Campo, lançado em 20.01.03, no Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento-MAPA, MDA e INCRA (no Distrito Federal e em Belo Horizonte) e queriam que eu o conhecesse e, se fosse o caso, o levasse a Deputados Federais interessados no assunto e, especialmente, ao segmento menos favorecido da agricultura nacional constituído pelos agricultores familiares. Conhecedora das dificuldades desse segmento agrícola e de várias e, infelizmente, infrutíferas tentativas de superá-las, interessei-me pelo Projeto.
Inteirada de seu conteúdo e de sua proposta, passei a me entusiasmar pelo mesmo e, conforme me pediram, fizemos um périplo pela Câmara Federal conversando com vários deputados, dentre os quais destaco Ariosto Holanda, Luiz Piauhylino, Gilmar Machado, Luiza Erundina, Telma de Souza, Adão Prieto e César Medeiros. Nessas conversas, acompanhei os representantes do IVC a vários Gabinetes e, a cada apresentação, ficava mais entusiasmada porque era a primeira vez que tomava conhecimento de uma proposta robusta e capaz de promover a inclusão dos segmentos mais carentes de nossa agricultura, mas não em programas assistencialistas, e sim em projetos de geração de renda e de conquista da cidadania.
Fiquei de tal forma envolvida que, em 19.03.03, requeri uma Audiência Pública, na Comissão de Ciência, Tecnologia e Informática, encaminhando ofício ao seu Presidente, Deputado Corauci Sobrinho, para que nela fosse debatido o Projeto Biodiesel & Sistema Volta ao Campo. Solicitava fossem convidados, dentre outros, Dr. Roberto Amaral (MCT), Dr. Roberto Rodrigues (MAPA), Dr. Miguel Rosseto (MDA), Prof. Vicente Rocha (SMAAB), Dr. José Clástode Martelli (IVC), Dr. Mário Sérgio Trento (IVC) e o Coordenador do antes mencionado Probiodiesel. Como justificativa, eu explicitava que a AUDIÊNCIA visava levar ao conhecimento público e aos membros daquela Comissão a importância do Projeto com foco na Agricultura Familiar, gerando emprego e renda no campo.
É preciso que se diga que, anteriormente, em 11.03.03, o IVC encaminhara a mim e ao Deputado César Medeiros, um ofício sugerindo que fosse desarquivado o Projeto do Deputado Mendes Thame, já referido, que fora arquivado em 31.01.03 ou, alternativamente, fosse apresentado outro similar, introduzindo-se a participação prioritária da AF na cadeia produtiva do biodiesel, com a produção de matéria prima viabilizada por uma assistência técnica integral, multidisciplinar, presencial e permanente, a esses pequenos agricultores, o que geraria muito mais emprego e renda do que a propiciada pela agricultura extensiva e mecanizada.
De pronto, em 12.03.03, encaminhamos, eu e o Deputado César Medeiros, ofício circunstanciado ao Ministro Roberto Amaral do MCT, anexando o Projeto Biodiesel & Sistema Volta ao Campo e solicitando, ao final, uma audiência para tratarmos do assunto e, ainda, o encaminhamento e integração à discussão desse Projeto dos demais órgãos do Governo, cuja participação reputamos de fundamental importância, especialmente o MDA, pelo foco predominante nele contido, de INCLUSÂO SOCIAL da AF, além do Ministério de Trabalho e Emprego, de Minas e Energia, do Meio Ambiente, da Casa Civil, da Educação, da Petrobras, da Agência Nacional de Petróleo e da Coordenação do Probiodiesel.
Entrementes, no mesmo dia em que requeri a AUDIÊNCIA PÙBLICA (19.03.03), o Deputado Rubens Otoni Gomide entrava com um Projeto de Lei que regulamentava o uso do biodiesel no Brasil, nos mesmos moldes da propositura do Deputado Mendes Thame, então arquivada e, tal como aquela, sem a inserção da AF no processo.
Paralelamente, atendendo nosso requerimento, foi marcada a Audiência Pública para o dia 07.05.03, no Plenário 13, Anexo II, às 11 horas, para debater o tema proposto por mim, qual seja o Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar.
Foram convidados para o debate o Secretário de Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia-MME, Marcelo Popp; a Secretária de Petróleo e Gás do MME, Maria das Graças Foster; o Secretário de Política Tecnológica e Empresarial do MCT, Francelino Grando; o Secretário de Agricultura Familiar do MDA, Valter Bianchini; o Administrador do INCRA, Ailson Silveira Machado; o sócio-gerente da Soyminas Biodiesel, Arthur Augusto Alves; o Diretor do Departamento do Açúcar e do Álcool do MAPA, Ângelo Bressan e o representante do Instituto Volta ao Campo de Desenvolvimento Rural - IVC.
Anteriormente fora realizado, em Ribeirão Preto, no dia 14.03.03, organizado pelo Laboratório de Desenvolvimento de Tecnologias Limpas - LADETEL, da Universidade de São Paulo, o Primeiro Congresso Internacional de Biodiesel que foi, ao lado das ações anteriormente mencionadas, um dos marcos mais importantes para a implementação do Programa do Biodiesel no Brasil. Foi depois desse Congresso que a Coordenação do Programa passou do MCT para o MME, antes de passar definitivamente para a Casa Civil. Infelizmente não se cogitava, ainda, da participação da agricultura familiar no processo.
Finalmente, no dia 07.05.03 foi realizada a AUDIÊNCIA PÚBLICA por mim solicitada e, após seu encerramento, tive oportunidade de ratificar minha opinião de que o Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar, proposto pelo IVC e que fora objeto de debate no evento, poderia viabilizar economicamente pequenos núcleos familiares, dando-lhes oportunidade de trabalho, aumentando significativamente sua renda e incluindo-os, definitivamente, na sociedade brasileira. Falei inclusive com o Presidente da Câmara, Deputado João Paulo, que prometeu que da primeira pauta do Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica, que seria reinstalado no dia 28.05.05, constaria o tema Biodiesel e Inclusão Social. A par disso informei, na ocasião, que me reuniria com o Ministro Miguel Rossetto para discutir estratégias de inclusão da produção do biodiesel para os assentados da RA em particular e, para a AF, de maneira geral.
Por sua importância histórica e por ser o marco inicial da inclusão social propiciada pelo Biodiesel, transcrevemos, em separado, os pronunciamentos dos técnicos que falaram em nome do IVC na audiência pública (O Economista José Honório Accarini e o Engenheiro Agrônomo Mário Sérgio Trento).
Posteriormente, em audiência que tive com o Ministro Chefe da Casa Civil, Sr. José Dirceu, em 18.06.03, entreguei ao mesmo o Ofício 142, de 2003, com os seguintes dizeres: “Sr. Ministro, submetemos ao conhecimento e à apreciação de V.Exa. o Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar, de alta relevância para solucionar questões importantes relativas à redução da dependência externa do petróleo e eliminação da pobreza no campo” Nessa mesma audiência, o Ministro confirmou minha participação no Grupo de Trabalho Interministerial que, por sugestão nossa, na Audiência Pública realizada em 07.05.03, antes referida, fora instituído pelo Presidente da República por meio de Decreto de 02.07.03, com o propósito de apresentar estudos sobre a viabilidade de utilização de óleo vegetal-biodiesel, como fonte alternativa de energia, e propor, caso necessário, as ações que garantam o seu uso.
Concomitantemente, em 18.06.03, o IVC encaminhava, a esta Deputada Federal, sugestão para um substitutivo ao Projeto de Lei do Deputado Rubens Otoni Gomide no qual se inseria o cultivo de matéria prima por pequenos produtores rurais e, para que fique consignado o foco da luta do IVC, transcrevemos o Parágrafo Terceiro do Art. 2° desse substitutivo sugerido.
“As fábricas adquirirão preferencialmente matéria-prima de produtores organizados em cooperativas de produção que, para se habilitarem a essa venda, deverão manter contratos/convênios com associações de técnicos que assistam seus associados integral, multidisciplinar, permanente e proativamente, de forma a garantir o fornecimento dos produtos com qualidade e regularidade necessárias.”
SEGUNDA PARTE
Por todo o empenho que tivemos para incluir a AF no Programa Biodiesel, que já tomara o nome de Biodiesel e Inclusão Social desde a reinstalação da Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica, presidido pelo Deputado Luiz Piauhylino, e que tinha como relator o grande defensor dessa inclusão, o Deputado Ariosto Holanda, passamos, eu e o IVC, a ter a esperança, ou seria melhor dizer, a certeza de que o GTI, instituído em 02.07.03, sob a Coordenação da Casa Civil da Presidência da República e composto por representantes do Ministério dos Transportes (MT); da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA); do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC); de Minas e Energia (MME); da Fazenda (MF); do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP); da Ciência e Tecnologia (MCT); do Meio Ambiente (MMA); do Desenvolvimento Agrário (MDA); da Integração Nacional (MI) e das Cidades (MCidades), concluiria pela inclusão da AF no Programa.
Convidados pela Casa Civil, a Prefeitura Municipal de Uberlândia - PMU e o IVC, participaram dos trabalhos do GTI, em reunião realizada no dia 25.09.03, na qual estiveram presentes, pelo GTI, representantes do MF, MT, MAPA, MDIC, MME, MP, MCT, MMA, MDA, MI e do MCidades; pela PMU o Eng. Agr. Telmo Vinicius da Silva e o Agrimensor José Soares de Aquino e, pelo IVC, o Eng.Agr. Mário Sérgio Trento e o Adv. Agrarista José Clástode Martelli. Participou também da reunião o Sr. Arthur Augusto Alves, sócio-gerente de uma pequena usina de biodiesel em Cássia-MG, que desenvolvia trabalhos em conjunto com o IVC no sentido de viabilizar uma indústria idêntica, em Uberlândia, com a participação da agricultura familiar.
Os trabalhos foram iniciados com a apresentação pelo Grupo de Uberlândia, do Projeto Biodiesel/Agricultura Familiar, com cópias entregues a cada um dos participantes, tendo como ideia básica a viabilização de assentamentos e AF mediante uma assistência técnica integral, multidisciplinar, permanente e presencial, com a organização de produtores, preferencialmente em cooperativas, para abastecer pequenas unidades fabris de biodiesel, garantindo a esses pequenos produtores uma renda que lhes proporcionasse sustento, progresso, dignidade e cidadania.
Como resultado imediato dos debates e das várias intervenções, ficou acertada uma viagem de representante ministeriais no GTI Biodiesel a Cássia-MG, onde estava a fábrica Soyminas Biodiesel, em pleno funcionamento (visita que se realizou posteriormente) e da conclusão a que se chegou da INDISPENSABILIDADE da Assistência Técnica, com a consequente organização dos produtores para um Programa que visa a alavancagem de oportunidades de trabalho, emprego e renda no segmento da pequena agricultura nacional.
Por oportuno e como alerta, já que atualmente 80% do biodiesel produzido no País provêm da soja, transcrevemos, também em separado, artigo publicado em 09.10.03, no Jornal CORREIO de Uberlândia, sobre a instalação do GTI, de autoria do Advogado Agrarista, Prof. José Clástode Martelli, então Presidente do Conselho Diretor do IVC.
Em 22.10.03, o Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica fez um convite ao IVC para que participasse de uma videoconferência a realizar-se em 05.11.03 sobre o tema Biodiesel e Inclusão Social e também sobre uma exposição a respeito do mesmo tema que teria lugar na Câmara dos Deputados, no período de 03 a 07.11.03. O IVC participou de ambos os eventos. No primeiro caso, sob o título Combustíveis Renováveis: Emprego e Renda no Campo, o pronunciamento do IVC, feito pelo Eng. Agr. Mário Sérgio Trento e pelo Prof. José Clástode Martelli está publicado no Caderno de Altos Estudos nº 1, do Conselho e segue a mesma linha de defesa da participação da AF no processo.
No mesmo dia da videoconferência, o Jornal O Estado de S. Paulo publicava um artigo desses mesmos representantes do IVCsob o título: O Biodiesel e os Municípios, em que abordam, dentre outras vantagens propiciadas pelo biodiesel, o aumento do PIB municipal, com instalação de usinas nos municípios. Também aqui, pela sua importância, e por interessar muito a Prefeitos, vamos transcrever esse artigo em separado.
Em 17.11.03, o IVC, ao agradecer ao Deputado Ariosto Holanda a oportunidade de participar dos trabalhos do Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica, escrevia:
"A par de termos enriquecido sobremaneira nosso conhecimento, a ponderada e eficiente condução dos trabalhos por parte de Vossa Excelência nos fez esperançosos de que a Assistência Técnica Integral, Multidisciplinar, Pró-ativa e Permanente a pequenos produtores rurais passe a ser entendida como pedra angular no processo de inclusão social através do biodiesel.”